Refletindo

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terça-feira, 12 de outubro de 2010

Professor Tchê criticando o sistema educacional na sua permissão perniciosa.

PERMISSÃO PERNICIOSA

Clarice Lispector tem um prisma interessante e inteligente no seut texto "Pescaria". Ela diz que para o homem, "pescar é esporte, mas, para o peixe há de ser guerra. E guerra de emboscada, que é a pior de todas".
Minha tia, na minha infância sempre contava uma charada de um diálogo, que até agora eu não me esqueço> "Sai daqui, se não eu te como aqui"!
"Se você me 'cumê' aqui, quem me pôs, te tira daqui".
Um dia, minha tia me revelou o enigma: era um colóquio entre o peixe e a isca.
Jesus, entre as suas brilhantes filosofias, tem aforimas que muito agora se fazem oportuno: "Tudo me é lícito, mas nem tudo permitido". "Tudo me é permitido, mas nem tudo me convêm".
As permissões oferecidas pelo alto escalão do governo permitem carnavais fora de épocas dentro das instituições públicas. É o bloco dos foliões mascarados pelo falso papel de cidadania.
Entenda meu querido leitor: em época de eleições; o funcionário público pode optar por exercer sua cidadania em permuta por ausencias nas suas atividades públicas. Um funcionário público, por exemplo, um professor, pode abandonar as salas de aulas por até seis dias (o que pode significar até doze dias consecutivos distante do oficio; uma irresistível mini-férias). Até aqui nada de errado, já que este abandono de oficio tem garantia de remuneração dentro da lei. O problema começa realçar a sua face, quando se percebe que estes "agrados legais" são autênticos presentes de grego.
Que bela isca da má administração do poder público. Logicamente, o professor da escola pública, sempre nadando nas águas turbulentas da sua insatisfação profissional acabará por morder estas iscas lançadas estrategicamente pela ideologia do governo. Estes abonos de abandonos se vestem em trajes de indenização salarial, uma forma de compensar o miserável salário e as péssimas condições de trabalho que são enfiadas na goela do profissional da educação.
Meu querido leitor: não estou contra os benefícios que são oferecidos pela (má)aquina administrativa do Estado. São todos permitidos, resta refletir se convêm.
A balbúrdia gerada por estas concessões, acelera impiedosamente a gravidades da qualidade do ensino público, estigmatizando na imagem do educador sem compromisso com a assiduidade.
O professor Júlio Groppa Aquino tem o seguinte veredicto:"Ainda que amparado por lei, o direito de se ausentar não pode contrapor-se ao dever maior de construir uma escola de qualidade."
"Pouquissimas profissões carregam o hábito das faltas ao trabalho de forma tão nítida como a nossa. O resultado são aulas vagas a profusão, calendários fictícios, conteúdos aligeirados..." Enfim, uma catástrofe sem precedentes, onde sem o mínimo de reflexão ( e também sem ingenuidade), assinamos o nosso próprio atestado de óbito profissional.
É preciso entender que baixas quantias de remuneração, não devem e nem podem significar vingança docente para cima do corpo discente. Depois, não adianta lamentar (dentro da sala dos professores durante o tempo de recreio) da falta de estrutura e investimento na educação pública. O governo cuspirá na nossa cara a nossa indolência enquanto educador, o nosso culto de cada dia ao deus dos vagabundos.
"Tudo me é lícito, mas nem tudo permitido". É preciso repensar as permissões perniciosas do poder público.
Professores e outros guerreiros da educação: estamos numa guerra. E guerra de emboscada, que é a pior de todas.
Cuidado, não se entusiasme com a regalia das ausências abençoadas por lei, são iscas.

Prof. Tchê - tchefilosofo@hotmail.com

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O mito da caverna (Platão)

"Imaginemos uma caverna subterrânea onde, desde a infância, geração após geração, seres humanos estão aprisionados. Suas pernas e seus pescoços estão algemados de tal modo que são forçados a permanecer sempre no mesmo lugar e a olhar apenas a frente, não podendo girar a cabeça nem para trás nem para os lados. A entrada da caverna permite que alguma luz exterior ali penetre, de modo que se possa, na semi-obscuridade, enxergar o que se passa no interior.A luz que ali entra provém de uma imensa e alta fogueira externa. Entre ele e os prisioneiros – no exterior, portanto – há um caminho ascendente ao longo do qual foi erguida uma mureta, como se fosse a parte frontal de um palco de marionetes. Ao longo dessa mureta-palco, homens transportam estatuetas de todo tipo, com figuras de seres humanos, animais e todas as coisas.Por causa da luz da fogueira e da posição ocupada por ela os prisioneiros enxergam na parede no fundo da caverna as sombras das estatuetas transportadas, mas sem poderem ver as próprias estatuetas, nem os homens que as transportam.Como jamais viram outra coisa, os prisioneiros imaginavam que as sombras vistas são as próprias coisas. Ou seja, não podem saber que são sombras, nem podem saber que são imagens (estatuetas de coisas), nem que há outros seres humanos reais fora da caverna. Também não podem saber que enxergam porque há a fogueira e a luz no exterior e imaginam que toda a luminosidade possível é a que reina na caverna.Que aconteceria -indaga Platão- se alguém libertasse os prisioneiros? Que faria um prisioneiro libertado? Em primeiro lugar, olharia toda a caverna, veria os outros seres humanos, a mureta, as estatuetas e a fogueira. Embora dolorido pelos anos de imobilidade, começaria a caminhar, dirigindo-se à entrada da caverna e, deparando com o caminho ascendente, nele adentraria.Num primeiro momento ficaria completamente cego, pois a fogueira na verdade é a luz do sol e ele ficaria inteiramente ofuscado por ela. Depois, acostumando-se com a claridade, veria os homens que transportam as estatuetas e, prosseguindo no caminho, enxergaria as próprias coisas, descobrindo que, durante toda a sua vida, não vira senão sombra de imagens (as sombras das estatuetas projetadas no fundo da caverna) e que somente agora está contemplando a própria realidade.Libertado e conhecedor do mundo, o prisioneiro regressaria à caverna, ficaria desnorteado pela escuridão, contaria aos outros o que viu e tentaria libertá-los.
Que lhe aconteceria nesse retorno? Os demais prisioneiros zombariam dele, não acreditariam em suas palavras e, se não conseguissem silenciá-lo com suas caçoadas, tentariam fazê-lo espancando-o e, se mesmo assim, ele teimasse em afirmar o que viu e os convidasse a sair da caverna, certamente acabariam por matá-lo. Mas, quem sabe alguns poderiam ouvi-lo e, contra a vontade dos demais, também decidissem sair da caverna rumo à realidade.
O que é a caverna? O mundo em que vivemos. Que são as sombras das estatuetas? As coisas materiais e sensoriais que percebemos. Quem é o prisioneiro que se liberta e sai da caverna? O filósofo. O que é a luz exterior do sol? A luz da verdade. O que é o mundo exterior? O mundo das idéias verdadeiras ou da verdadeira realidade. Qual o instrumento que liberta o filósofo e com o qual ele deseja libertar os outros prisioneiros? A dialética. O que é a visão do mundo real iluminado? A Filosofia. Por que os prisioneiros zombam, espancam e matam o filósofo (Platão está se referindo à condenação de Sócrates à morte pela assembléia ateniense)? Porque imaginam que o mundo sensível é o mundo real e o único verdadeiro."